segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

A arte do desencontro IV

Rita chegou a sua casa totalmente arrasada e seu marido quis saber o motivo.
- Perdi o colar de que mais gostava. Era um que tenho desde a minha adolescência. Usei-o nos momentos mais importantes da minha vida; inclusive em nosso casamento. Procurei em todos os lugares possíveis. Agora mesmo, estou voltando do lugar que era minha última esperança de encontrá-lo, mas não o encontrei. Estou arrasada.
Mario, seu marido, não se conformava com aquela atitude que considerava muito materialista e tentava demonstrar isso:
- Rita, isso é só um colar. É uma coisa. Não é possível que você dê tanta importância assim, a ponto de ficar tão arrasada. Pelo amor de Deus, é um colar apenas. Na vida existem coisas muito mais importantes do que um colar. Tem tanta gente no mundo passando por dificuldades infinitamente maiores do que a simples perda de um colar. Você deveria se envergonhar.
O marido apenas acabou de falar e Rita desandou a chorar ainda mais. Mario só fez piorar a situação. Rita chegava a soluçar. Na hora de dormir, confessou ao marido que o que mais tinha deixado ela triste, nem tinha sido a perda do colar, mas a falta de companheirismo dele. Ao invés de tentar consolá-la ele lhe passou um enorme sermão. Aquilo tinha deixado Rita muito triste e decepcionada.
Mario ficou tão chateado com a confissão de Rita que perdeu o sono e ficou fritando na cama durante toda a madrugada, tanto que acordou com as olheiras escuras.
Mario então decidiu correr atrás do prejuízo. Procurou pelo colar no álbum de fotos de seu casamento, já que não fazia a mais vaga idéia de como ele era. Isso ele manteve em segredo para não piorar ainda mais as coisas. Espantou-se ao ver como Rita era muito mais moça e bem mais magra naquela época mas encontrou uma foto onde o colar estava muito visível. Bem verdade, não achou nada demais no colar, mas como não era para ele e sim para ela, separou a foto com todo cuidado e guardou o álbum. Passou a andar com a foto no bolso, visitou inúmeras joalherias, sites de busca, chegou até a contratar os serviços de um detetive particular para encontrar o tal colar. Estava decidido a reparar sua grosseria, insensibilidade ou sei lá como Rita havia qualificado sua atitude daquele dia.
Já tinham se passado dois meses quando, finalmente, a dona de uma das incontáveis joalherias com quem Mario tinha deixado a foto, telefonou informando ter encontrado uma peça quase idêntica. Mario cancelou seus compromissos, desmarcou reuniões e foi correndo a tal joalheria.
Realmente o colar era muito parecido com o da foto. Quase idêntico nas palavras da dona da joalheria. Mal podia esperar para ver a felicidade de Rita quando abrisse o pacote e encontrasse o colar. Aproveitou que já tinha cancelado seus compromissos para ir até a joalheria e não voltou ao trabalho, foi correndo para casa.
Rita se surpreendeu ao ver Mario chegar tão cedo. Ele foi logo explicando:
- Vim para casa mais cedo por que não agüentei esperar. Dito isso estendeu as mãos na direção de Rita com o pacote do colar.
Rita sorriu, apanhou o pacote e, à medida que se encaminhava ao sofá, foi fazendo aqueles gracejos tão típicos nessas ocasiões:
- Ôpa, um presente. Que beleza. O que será que é? Vamos ver se adivinho. Rita pesou o presente na mão, cheirou, apalpou e sentou-se para abri-lo.
- O que será que é? Estou curiosa. Vamos ver o que é. O que será?
Mário estava muito contente e seu largo sorriso demonstrava isso. Durante todo o trajeto até a sua casa foi fantasiando a reação de Rita quando visse o colar, Será que choraria de novo? Provavelmente sim. E depois do choro? Talvez pulasse em seu pescoço e o enchesse de beijos e juras de amor. Ou será que lhe prepararia um jantar à luz de velas, com seu prato preferido, seguido por uma noite de amor inesquecível? Mario foi imaginando tudo isso até chegar a sua casa.
Finalmente Rita abriu o pacote. Tomou o colar em suas mãos, afastou-o do rosto, olhou bem para ele, passou pelos dedos como fosse um terço e após um breve silêncio disse:
- Nossa Mario, mas que tremenda falta de originalidade. Quando éramos namorados você costumava ser bem mais criativo.